Texto e Edição: Gustavo Franchini

Uma das maiores bandas de heavy metal do país, orgulho nacional e forte representante em eventos mundo afora, o Angra definitamente é um nome de respeito no concerne a qualidade, técnica, criatividade e inovação em sua época, hoje já experimentando novas sonoridades, nova formação e público renovado. Portanto, ter a informação de que vão entrar em hiato com data indefinida é um marco na história do gênero, o que fez com que dezenas de milhares de fãs comparecessem em sua última turnê deste ano (e talvez da carreira, sabe-se lá). O show no Rio de Janeiro ocorreu no dia 01 de agosto para um ótimo público e contou com banda de abertura que surpreendeu a muitos.
O nome desta é Azeroth, que se inspirou não só no jogo de computador Warcraft, famoso entre os nerds de plantão (e o que vos fala), mas também em um som que lembra muito o próprio Rhapsody of Fire de Fabio Lione, em todos os sentidos possíveis, inclusive tendo participação do mesmo em uma das canções do álbum lançado este ano, Trails of Destiny. Particularmente, achei uma mistura saudável da já citada banda, Stratovarius e Masterplan na fase do vocalista Mike DiMeo.
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Só que as semelhanças param por aí, pois o sexteto argentino entrega sua própria identidade em músicas interessantes, animadas e épicas, tendo como frontman o carismático Nacho Rodriguez, que além de ser um verdadeiro talento na voz, seguro nas notas e com alcance invejável, interage bastante com a plateia, tendo humildade para agradecer pelo respeito dos brasileiros, já que a todo momento recebeu aplausos, apoio e elogios, mesmo executando um repertório que a maioria não conhecia e não fazia noção do que esperar. Espero que voltem mais vezes para cá, pois é uma banda com bastante potencial em eventos ligados ao gênero, aliás, poderiam até serem sondados para o próximo Bangers Open Air de 2026; acho que fariam um impacto no festival e ganhariam novos fãs! Veja fotos e setlist do show deles ao final da matéria.
Com alguns minutos de atraso, o Angra sobe ao palco para a tão esperada comemoração de 20 anos do excelente álbum Temple of Shadows (2004), que curiosamente começa na realidade com “Nothing to Say”, do clássico Holy Land (1996), uma das melhores composições do grupo, levando a galera ao êxtase logo de cara. Talvez seja um recurso acessível para a voz de Lione que, por necessitar cantar músicas da era do saudoso Andre Matos, que possuía um registro vocal bem mais agudo que o normal para um cantor masculino, é melhor que as mais complicadas sejam apresentadas quando a voz está intacta ainda. E depois da espetacular “Millenium Sun”, que acredito se encaixar perfeitamente na voz dele, originalmente cantada por Edu Falaschi no maravilhoso Rebirth (2001), vem de fato uma gravada pelo próprio Lione em Cycles of Pain (2023), as duas partes de “Tide of Changes”, que possui um refrão bem empolgante.
A partir dali a intro de “Deus le volt!” começa no PA e aí todo mundo já sabe que chegou a hora do Temple of Shadows na íntegra, o que também significava uma concentração máxima por parte dos membros da banda, já que a maioria das faixas tem uma complexidade acima de outros álbuns. “Spread Your Fire”, “Angels and Demons” e “Waiting Silence” abrem a trinca com maestria, sendo a primeira mais speed metal, e as outras com ritmo cadenciado, antes da balada “Wishing Well”, que foi cantada em uníssono por todos. Neste momento, deu pra perceber com mais clareza que a produção deste show em específico estava mais refinada do que o normal, em um belíssimo trabalho de telões e iluminação por parte da equipe.
A cozinha é atualmente composta pelo guitarrista Rafael Bittencourt, fundador e único integrante desde a formação original, o baixista Felipe Andreoli (desde 2001 na era Edu), e o trio mais recente: o guitarrista Marcelo Barbosa, o vocalista italiano Fabio Lione e o batera Bruno Valverde. Vale ressaltar que há um entrosamento incrível entre eles, algo perceptível nos 10 anos que estão tocando juntos, o que reforça a fala de Rafael em diversas entrevistas ao citar esta formação como a “melhor que já estive, em todos os sentidos, especialmente na convivência”. É um dos motivos para a pausa, pois ele quer manter o aspecto saudável do trabalho em si, assim evitando ocorrer problemas pelo desgaste em shows, gravações e compromissos constantes que podem minar o clima nos bastidores. Ou seja, o objetivo é a preservação do Angra como grupo longevo que é.
Se tem uma canção que poderia ser considerada uma marca registrada do power metal, seja pelas suas paradinhas de bateria, arpejos e riffs virtuosos (com direito até a um interlude com influência de música clássica no sample de violinos), definitivamente é a fabulosa “The Temple of Hate”, não à toa considerada pela banda a mais difícil de ser executada ao vivo. Haja vigor para conseguir tocar tudo exatamente como gravado em estúdio! Seria legal Rafael dividir os vocais com o mago nessa, já que ele canta alguns trechos de canções desde sempre, combinaria bastante com o dueto Edu/Kai Hansen da original.
Outra trinca de peso surge com “The Shadow Hunter”, “No Pain for the Dead” e “Winds of Destination”. Se aproximando da parte mais emotiva do setlist, de fato são músicas muito intensas, mudanças entre passagens rápidas e lentas, todas muito bem conduzidas e tendo o visual adequado nos telões, que geram a atmosfera necessária. Era possível ver algumas lágrimas escorrendo de fãs que realmente estavam aproveitando aquele momento como se fosse o último. Destaque no quesito técnico para Barbosa e Valverde que foram impecáveis na execução de linhas que foram gravadas por ninguém menos do que Kiko Loureiro e Aquiles Priester, o que está longe de ser uma tarefa fácil para quem é músico e entende do assunto.

A outra considerada balada é “Sprouts of Time”, que com seu lindo refrão, base de guitarra e solo parcialmente inspirado na música flamenco é uma das mais extraordinárias do álbum, e ficou bem legal em cima do palco. “Morning Star” me parece uma canção que poderia ter sido composta nos álbuns mais recentes (ela é a cara do Cycles of Pain em sonoridade); é até interessante ver como ela tem seções tão distintas e que funcionam tão bem em conjunto. E, claro, a fenomenal “Late Redemption”, que dispensa comentários, mas pode-se dizer que talvez seja o melhor encerramento de um disco de toda a história do metal brasileiro.
Após a conclusão do tema central do espetáculo, os hits da carreira da banda continuariam marcando presença, como a sempre pedida “Rebirth”, que conta com coros e tudo possível para o público participar do início ao fim. As rodinhas começaram com força total em “Angels Cry”, que mesmo sendo uma canção que Rafael ter dito em entrevista não achar tão boa quanto outras, longe de ser sua favorita, acredito que a animação da plateia discorde plenamente (risos). E a surpresa ficou com a homenagem ao recém-falecido ícone do heavy metal, Ozzy Osbourne (ex-Black Sabbath), que nos deixou recentemente e foi brindado com a versão cover da headbanging “No More Tears”, que faz parte de seu disco solo homônimo de 1991.
Um breve intervalo com a banda saindo do palco para o bis, deixou bem claro que o momento metaleiro raiz se aproximava no final, pois o dueto clássico “Carry On/Nova Era”, quase considerado um medley pelo fato de “Carry On” pular a última ponte e refrão (para a tristeza de muitos), realmente fez com que a galera toda enlouquecesse, chegando a tremer o chão. Agora nos resta torcer para que o Angra consiga descansar e renovar as forças neste hiato. E no futuro possa presentear os fãs com uma volta cheia de novidades. Se não for o caso, de qualquer maneira foi um encerramento digno de uma banda que com certeza influenciou demais o cenário do rock/metal no Brasil e seu legado está marcado para sempre na história da música mundial. Parabéns e obrigado por tudo!
Nossos agradecimentos a todos os responsáveis por tornarem o evento possível e, em especial, para a Rider2 e Top Link pela parceria, confiança e credibilidade dada mais uma vez à equipe do Universo do Rock.
Veja a galeria de fotos do show (Angra/ RJ):



































*”No More Tears” (Ozzy Osbourne) foi incluída na hora do show entre “Angels Cry” e “Carry On/Nova Era”
Veja a galeria de fotos do show (Azeroth/ RJ):











Setlist Azeroth:
1 – Left Behind
2 – Ancient Trail
3 – Falling Mask
4 – La Salida
5 – Beyond Chaos
6 – Trails of Destiny
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