Por: Gustavo Franchini
Depois de anos sem pisar em terras brasileiras, o baixista Roger Waters (ex-Pink Floyd, também vocalista e principal compositor da banda) volta em turnê pela América do Sul para apresentar o seu espetáculo de grande sucesso mundial, The Wall, no qual toca o disco homônimo na íntegra, com grandes efeitos especiais, em clima de musical da Broadway e som de incrível qualidade.
O álbum conceitual The Wall foi lançado em 1979 e, desde então, muitos fãs almejam assistir ao show teatral, considerado um dos maiores do rock. Em forma de ópera rock, The Wall conta a história de Pink, um personagem baseado em Roger Waters e que representa uma frustração do baixista com os seus espectadores na época, além de uma conotação social-política bem intensa.
A história começa com as experiências de vida de Pink, que perde o seu pai na Segunda Guerra Mundial, é ridicularizado pelos professores na escola, convive com uma mãe superprotetora e enfrenta problemas no seu casamento. Com o intuito de se isolar da sociedade, ele constrói um muro metafórico e cria um mundo de fantasia para si, em sua consciência. No decorrer deste processo, Pink entra em uma alucinação causada pelas drogas, se torna um ditador fascista, é julgado pela sua consciência rebelde e seu juiz interior ordena a abertura para o mundo exterior.
Com a casa cheia, porém não lotada, o público foi se aglomerando no Engenhão. Às 21hs, horário marcado para o show começar, parte dos fãs ainda estavam nas filas para entrar, que eram extensas e confusas. Contudo, como São Pedro já tinha segurado a chuva para esta noite inesquecível, todos já estavam no estádio antes da abertura do show, que acabou começando às 21:30. “In The Flesh” e “The Thin Ice” incendeiam o palco com muita pirotecnia, luzes extraordinárias, atores vestidos de soldados e muitos efeitos visuais, logo de cara, para a vibração do público.
A partir daí, tudo era tão incrível e impressionante, que fica difícil descrever o brilho nos olhos de cada um presente naquela noite. O avião que surge na parte de trás do estádio e vai de encontro com o muro explodindo em fogos de artifício, para o delírio dos que não tinham conhecimento deste detalhe do espetáculo. As marionetes gigantes que representam diversos elementos do The Wall, como o professor em “Another Brick In The Wall”, que ainda contou com a participação de crianças carentes da Rocinha, interagindo com o grande boneco. A homenagem ao brasileiro Jean Charles de Menezes, que foi baleado por acidente pela polícia (SO19 da Scotland Yard) dentro de um metrô londrino, ao ser confundido com um terrorista procurado. Demais!
O muro construído na frente do palco exibia imagens e efeitos de tirar o fôlego. Com imagens do filme “Pink Floyd: The Wall” (lançado em 1982, por Alan Parker), interações entre Roger Waters e os elementos que surgiam nos blocos, não dava nem tempo de dispersar os olhos, talvez apenas quando o famoso balão em formato de porco (com frases de protesto em português inscritos nele) surgiu no alto da plateia, descendo aos poucos e se aproximando de todos. O baixista arriscou um português bem arrastado para manifestar a sua felicidade em estar no Brasil novamente e demonstrando a importância das questões sociais no país. Digno de um gênio!
Mas o show que estava perfeito, conseguiu surpreender ainda mais: no decorrer das músicas, o muro ia se fechando para o público e, antes do final da primeira parte do show (que representa a conclusão do primeiro vinil/cd), o muro estava completamente fechado, impedindo o público de ver o palco e Waters de ver os seus espectadores, em uma sacada genial do baixista em simbolizar a tal frustração da época em que lançou o álbum e toda esta ideia de separação público/banda. A maravilhosa “Hey You” foi inteiramente executada sem a visão do palco. Isso mesmo, não era possível ver nada além do muro gigantesco de 137 metros de largura. Em outras músicas, Waters surge em pedaços do bloco com o guitarrista, apenas para executar a linda “Nobody Home” e também para cantar em um cenário de escritório que foi projetado para fora do muro, em uma cena fantástica e bastante original. Brilhante!
O grande destaque da banda que acompanha Roger Waters, sem dúvida alguma, vai para o guitarrista Dave Kilminster, que além de executar as músicas tocadas por David Gilmour com perfeição (o que não é nada fácil), ainda nos presenteou com um momento de deixar qualquer roqueiro em puro êxtase: durante a clássica “Comfortably Numb”, Kilminster surge no topo do muro para tocar o solo (!!!), em uma performance que fez com que o mais devoto fã de David Gilmour tirasse o chapéu. Se não foi o melhor momento do show, provavelmente foi um dos melhores. Fantástico!
No final do show, assim como na história do álbum, o muro vai abaixo e os blocos caem no chão de forma literal. Então, os integrantes da banda de Roger Waters vão para a frente do palco, tocam uma música meio folk (misturada com ritmos brasileiros), são apresentados para o público e assim se encerra o que pode ser considerado um dos melhores shows da história. Realmente nunca vi um show com uma produção de palco tão intensa, magnífica. A grandiosidade de cada elemento do The Wall me deixou sem palavras! Não sei se é possível algum show me surpreender depois deste, pelo menos, em termos de produção. Agora nos resta aguardar uma nova turnê de Roger Waters por aqui, quem sabe com algum dos integrantes originais do Pink Floyd e tocando outro álbum clássico da banda? Vamos torcer!
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