Por: Carla Maio
São Paulo estremeceu na noite do último domingo (4) ao som dos riffs poderosos da guitarra de Steve Vai. Com um jaleco de capuz e guitarra iluminados, o americano ganha o palco do Tom Brasil no comando da “Passion and Warfare 25th Anniversary”, turnê que chegou à capital paulista depois de passar por Brasília, Belo Horizonte e Rio de Janeiro antes de seguir para Porto Alegre e Curitiba.
O show, repleto de surpresas muito especiais, apresentou Passion and Warfare na íntegra, segundo álbum de estúdio do guitarrista, lançado em setembro de 1990. Por meio de projeções de vídeos, o show também levou os fãs a passagens significantes da carreira de Steve Vai, um recorte magnífico que presenteou o público com imagens, videoclipes e trechos de outros momentos no palco, ao lado de parceiros incríveis.
Um espetáculo de cores e luzes, a iluminação da casa compôs em harmonia o conjunto de sons e imagens projetadas, dando vazão para que as composições, todas elas extremamente pesadas, chegassem à mente por outras vias além da visão e audição. A sensação era como se os solos penetrassem os corpos também pelos poros.
Tocar guitarra com a alma
Extraordinário, o show começa com a cena do pacto com o demônio no filme A Encruzilhada (EUA, 1986, 96 min). O filme marca a brilhante atuação de Vai, que interpreta Jack Butler, o guitarrista do Diabo, num duelo de guitarras surpreendente com o ator Ralph Macchio, cena incrível de luta entre o bem e o mal, cheia de riffs magistrais.
As quatro primeiras músicas “Bad Horsie”, “Tender Surrender” (Alien Love Secrets, 1995), “The Crying Machine” (Fire Garden, 1996) e “Gravity Storm” (The Story of Light, 2012) dão mostras claras da virtuosa carreira de Vai e marcam o início de um show inesquecível.
Performático, Vai faz sua guitarra gritar, utilizando técnicas as mais variadas, palhetadas, grooves, pedais, todo o arsenal necessário para dar a exata amplitude e potencialidade de seu instrumento.
E não é papo de guitarrista; Vai utiliza todas as técnicas possíveis e imagináveis em inúmeras composições. Insaciável, toca guitarra com a língua, assopra as cordas, arrancando suspiros do instrumento.
Entre um solo e outro, Vai se desdobra entre caras e bocas, modos de expressão bastante peculiares de quem toca guitarra de dentro para fora, com a alma.
Uma turnê repleta de surpresas
“Espero que vocês estejam se sentindo tão bem quanto nós essa noite. É tão bom estar de volta, tenho certeza que já vi muitos de vocês por ai e quero agradecer imensamente por terem vindo”, cumprimenta efusivamente Vai.
O guitarrista confessa que, há 30 anos, quando começou a compor Passion and Warfare, ele não esperava nenhum retorno dos fãs, não esperava que ninguém fosse, de fato, ouvi-lo. Satisfeito, ele comemora com gratidão a turnê inédita do álbum que se concretiza na realização de um sonho.
A materialização desse sonho é alcançada, sobretudo, com a maestria de grandes músicos, caras como o baterista Jeremy Colson, que não economizou pancadas nas muitas investidas e desafios que Vai lhe fez durante todo o espetáculo. Outro músico brilhante, o guitarrista Dave Weiner, é figura essencial na simbiose sonora entre as guitarras. Aclamado pela crítica como um baixista com B maiúsculo, Philip Bynoe é outro músico de peso, que arranca swings espetaculares de seu instrumento.
Outra faceta bem sucedida da turnê foi a extrema utilização dos recursos audiovisuais, que garantiram uma interação a níveis inigualáveis e um show repleto de convidados surpreendentes. O primeiro a surgir na projeção, o guitarrista do Queen, Brian May, leva os fãs a uma espécie de viagem pelo túnel do tempo e logo estamos todos de volta a 1991, na cidade de Sevilla, Espanha, assistindo à belíssima performance de ambos em “Liberty”.
Mesmo que de modo virtual, a divertida presença de Joe Satriani foi aclamada pelo público na execução de “Answers”. Outro videoclipe que divertiu o público foi o da música “The Audience Is Listening”, que contou com a também virtual presença de John Petrucci, guitarrista da banda Dream Theater.
Mas foi somente em “Stevie’s Spanking” quando Steve Vai trouxe Frank Zappa na projeção, que os incrédulos desmoronaram e o sentimento que imperou foi saudade, mesmo que jamais tenhamos visto um show de Zappa pessoalmente.
Quem nasceu primeiro, Steve ou a guitarra?
Para Steve Vai, “Love Secrets” é a mais estranha do álbum Passion and Warfare, e realmente, a música lembra um todo minimalista com nuances cheias de assombros. Esperada pelos fãs, a belíssima “For The Love Of God” foi outro grande destaque da noite.
Ao longo de mais de 2 horas de show, Steve Vai cumpre a promessa de executar Passion e Warfare na íntegra, num espetáculo orgasmatrônico repleto de distorções, nas quais o músico simula expressões em que parece arrancar um alienígena sonoro de dentro da guitarra.
Transpirando simpatia por todos os poros, Vai não deixa passar nenhuma oportunidade de interagir com o público, de olhar mesmo nos olhos de cada um e demonstrar empatia. Passion and Warfare é, antes de tudo, um show repleto de emoções e expressões.
E como o melhor sempre fica para o final, foi o público quem ganhou o presente em “Taurus Bulba”, quando Vai desce para a plateia e dá uma volta pelo pit, pedindo ajuda a uma fã, que faz a vez como solista.
Na despedida, o bruxo da guitarra transforma em palavras tudo aquilo que todos sentem, afinal, são os fãs a grande razão de tudo isso existir. É ele, Steve Vai, quem tem muito a nos agradecer: “Thank you, thank you, thank you”.
Set list
90″ excerpt from the 1986 film “Crossroads”
Bad Horsie
The Crying Machine
Gravity Storm
Tender Surrender
Liberty
Erotic Nightmares
The Animal
Answers
The Riddle
Ballerina 12/24
For The Love Of God
The Audience Is Listening
I Would Love To
Blue Powder
Greasy Kid’s Stuff
Alien Water Kiss
Sisters
Love Secrets
Stevie’s Spanking
Racing the World
Encore:
Fire Garden Suite IV – Taurus Bulba
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