The Who estreia no Brasil com show épico no primeiro dia do São Paulo Trip

Por Daniela Baroni
Foto: Ricardo Matsukawa / Mercury Concerts

Com o Rock in Rio rolando desde a semana passada e recheado de atrações incríveis, nada seria mais justo do que dar um gostinho do evento para os paulistanos que ficaram sedentos vendo os shows pela televisão. O responsável por tornar possível essa oportunidade de ouro é o São Paulo Trip, festival que faz sua estreia este ano e mostra que veio para ficar. Tendo seu conceito inspirado em Jack Kerouac e a geração beat, o São Paulo Trip acertadamente traz ao palco do Allianz Parque bandas que de fato são perfeitas para se ouvir na estrada, entre elas estão Aerosmith, Bon Jovi, Alice Cooper, Guns N’ Roses e a grande atração desta quinta-feira (21/09): o The Who, que pisava pela primeira vez em terras tupiniquins.

A noite não foi de primeiras vezes somente para a banda inglesa; o Alter Bridge também nunca havia desembarcado no Brasil, embora alguns de seus membros já tenham tocado aqui quando eram integrantes do Creed. Os americanos do Alter Bridge ficaram responsáveis por abrir bem cedo a sequência de shows da quinta e tiveram que encarar um estádio quase vazio, uma vez que muita gente corria do trabalho para chegar lá. Contudo, nada disso foi problema, já que, entre as músicas, que incluíram “Metalingus”, “Open Their Eyes” e “Addicted to Pain”, o vocalista Myles Kennedy não parava de sorrir chocado com o fato de que as poucas pessoas que estavam na pista premium tinham as letras de suas músicas na ponta da língua e gritavam cada palavra. Kennedy arriscou um “E aí, galera” em português e dizia como era bom estar lá sempre que podia, além de lembrar da honra que era estar abrindo para bandas tão icônicas que, convenhamos, não tinham muito a ver com o pós-grunge do grupo de abertura.

The Cult 10 x Público 0

Foto: Ricardo Matsukawa / Mercury Concerts

Com o relógio próximo das 20h, as luzes do Allianz Parque apagaram novamente e quem entrou dessa vez foi a banda inglesa The Cult. O show foi iniciado com “Wild Flower” e, ao fim da segunda música “Rain”, o vocalista Ian Atsbury puxou um “Ole Ole Ole Ole Brasil! Brasil! You are so beautiful!”, já deixando claro que estava muito animado por estar lá. No entanto, durante as próximas músicas, era possível notar uma mudança no comportamento de Atsbury, acenava muito para plateia, sempre pedindo mais barulho e fazendo sinais de perplexidade; chegou inclusive a apontar que não estavam em uma biblioteca. Se o vocalista, que não é nenhum estranho no Brasil, parecia desconfortável, não havia mais como disfarçar depois de “Lil’ Devil”, quando disse “Aqui é o Brasil, né? Vocês têm certeza? Não parece o Brasil para mim. Dancem! Se mexam!”. E pela duração da música seguinte, a bronca pareceu ter funcionado, mas por pouco tempo.

O estádio encontrava-se muito mais cheio, mas era o The Who que o povo queria. Isso poderia ter prejudicado a apresentação de diversas bandas incumbidas com a abertura de um evento, mas não o The Cult. Ian Atsbury encarou a situação como um desafio e tirou da manga todos os truques que o tornaram um frontman de primeira nesses trinta e poucos anos de carreira: pulava freneticamente, corria por toda extensão do palco para interagir com ambos os lados da plateia, batia palmas, jogava seus tamborins na plateia e chegou até a mandar um cara parar de falar com a mãe no celular e prestar atenção no show. Incluindo no setlist duas músicas do álbum lançado ano passado, Hidden City (cuja capa decorava o fundo do palco), a apresentação também contou com hits como “Sweet Soul Sister”, “She Sells Sanctuary” e “Love Removal Machine”, que encerrou o espetáculo inabalável que foi o show do The Cult.

The Who: A primeira vez a gente nunca esquece

Foto: Ricardo Matsukawa / Mercury Concerts

“É a nossa primeira vez na América do Sul e estamos muito felizes de estar aqui”, disse Pete Townshend depois de tocar quatro músicas na sequência. A plateia do Allianz Parque estava mais do que ciente disso antes de o The Who entrar no palco: Eram os responsáveis por dar as boas-vindas à lendária banda em nome de todo o continente. Muita responsabilidade.

Enquanto o estádio ainda estava com as luzes ligadas, o telão central começou a mostrar alguns elementos da história do The Who e encerrou com fotos de John Entwistle, baixista falecido em 2002, e Keith Moon, baterista falecido em 1978, o que fez com que o público começasse a aplaudir e sentir o momento finalmente se aproximando. Então, o mesmo telão mostrou as palavras “Mantenha a calma, aí vem o The Who”. Roger Daltrey, Pete Townshend e companhia subiram no palco distribuindo sorrisos e, com um breve aceno, “I can’t Explain” já ressoou.

Uma coisa era certa, não parecia que a plateia que estava ali era a mesma que levou bronca durante o show do The Cult. Fosse a turma da velha guarda do rock ou a turma que conheceu o The Who pelos pais, todos pulavam e cantavam as músicas com os braços para o alto, mesmo quando não sabiam as letras direito.

Sem muito papo, Daltrey sorria e girava o microfone pelo fio enquanto percorria o palco para ouvir os fãs cantando, sempre mostrando simpatia. Teve também a chance de mostrar que sua voz continua impecável mesmo depois de tantos anos, especialmente na não tão conhecida “Love Reign O’er me”. Considerado um dos maiores guitarristas de todos os tempos, Townshend mostrou a que veio. Fazia o famoso giro de braço na guitarra enquanto tocava, improvisava solos e transbordava carisma para o público. O destaque aqui também vai para o baterista Zak Starkey. Filho de Ringo Starr, Starkey parecia encarnar Keith Moon em sua forma energética de tocar e reproduzia de forma esplêndida as composições originais das músicas.

Com mais de 50 anos de repertório, o setlist do show foi uma verdadeira aula de história do The Who, passando por diversas fases da banda. “My Generation”, “Behind Blue Eyes” e “Who Are You” foram algumas das músicas que não poderiam faltar na apresentação, mas a instrumental “The Rock” provou que o inesperado pode ser também uma agradável surpresa. Mas que realmente deixou o público eufórico foi a perfeita sequência tripla que incluiu “Pinball Wizard”, “See me, Feel me” e a apoteótica “Baba O’Riley”, que levantou o astral dos fãs ao máximo. “Won’t get fooled again” encerrou a primeira parte do show e o bis trouxe “5:15”, que parecia ser a conclusão do show. Muita gente já ia em direção às saídas quando Townshend, como se tivesse sido convencido, voltou e deu início a “Substitute”, um dos clássicos sons do início da carreira do The Who e última música da noite.

Todos os olhos que tinham ficado fixos no palco durante as duas horas da apresentação finalmente olhavam em volta como se tivessem acordado de um sonho. E a sensação era essa mesmo. Havia uma vibe surreal no ar, não parecia ser verdade que o The Who, uma das bandas mais aguardadas pelos brasileiros, tinha acabado de se despedir do seu primeiro show em São Paulo, no Brasil e na América Latina. Sabendo que a banda seguia rumo ao Rock in Rio, a vontade era de comprar uma passagem o quanto antes.

Setlist do The Who:

I Can’t Explain
The Seeker
Who Are You
The Kids Are Alright
I Can See for Miles
My Generation (com trecho de Cry If You Want)
Bargain
Behind Blue Eyes
Join Together
You Better You Bet
I’m One
The Rock
Love, Reign O’er Me
Eminence Front
Amazing Journey
Sparks
Pinball Wizard
See Me, Feel Me
Baba O’Riley
Won’t Get Fooled Again
5:15 (bis)
Substitute (bis)

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