Bullet for My Valentine rápido e rasteiro em SP

Por Daniel Croce

Banda do País de Gales põe o público paulistano no bolso em 82 minutos ininterruptos de show

Foto: Daniel Croce

Em 2018, quando o quarteto de Cardiff lançou seu mais recente álbum, Gravity, o lema da (implacável) internet era #freepadge. Numa alusão ao virtuoso guitarrista da banda Bullet for My Valentine, Michael Paget, recém quarentão, os fãs de longa data perceberam uma característica St. Anger (em referência ao Metallica) no play: não havia solos de guitarra – os clássicos ‘lead breaks’ – onde Padge prova que é um dos melhores de longe da sua geração, junto com Synyster Gates, Corey Beaulieu; para citar os mais famosos.

Para os ainda mais puristas da era The Poison (2005), Scream Aim Fire (2008) e Fever (2010), a coisa pode piorar: um monte de tecladinhos, efeitos e corais ‘infantis’, os quais arremetem ao disco de maior sucesso dos compatriotas do Reino Unido, e de igual nome comprido: o lançamento de 2015 do Bring Me the Horizon, batizado de That’s The Spirit. Vendeu mais que água para beduíno no deserto. Se com eles funcionou, e eram um deathcore desgraçado em início de carreira, por que não funcionaria com o BFMV, muito mais voltados para o metal tradicional, thrash, power e com aquela pitada de emocore?

O público tinha as músicas novas na ponta da língua e a faixa etária média ali girava em torno de 18 a 23 anos. Abrindo com a porrada “I Don’t Need You”, a micareta metalcore não deixou ninguém parado. Bastou emendar a intro de batera “Scream Aim Fire” que não restava mais dúvidas: os três primeiros são o chamado ‘True Bullet’. E, se havia dúvidas, foi sucedida de outro groove mortal, do novo e excelente baterista Jason Bowld (ex Blaze Bayley e Pitchshifter, no qual foi baterista por 18 anos), na forma de “Your Betrayal”. A essa altura do campeonato, o BFMV virou o Flamengo, nem precisou terminar o jogo para ganhar.

Mesmo com um público tão ‘xofem’, toda vez que Padge largava o aço nos solos, o público parecia gostar (e muito). Lindos solos em “The Last Fight”, na rápida “No Way Out”, representando o álbum anterior Venom (2015), e por vezes dobrados com o vocal/guitarra Matthew Tucker, como em “Suffocating Under the Words of Sorrow”. Quem disse que a criançada não curte uma fritura? Tucker, por sua vez, brilha fácil como frontman, e relembra que também já gostou de debulhar seu instrumento, visível em “Hand of Blood”. Como disse: ‘Essa música não estava no setlist, então se a gente errar, não postem na internet, ok?’.

E, assim, foi um festival de rodas de pogo, tanto na pista premium quanto na ‘pobrium’. E sim, eles comeram um pedaço de instrumental do meio, e Padge até fez cara de ‘como vocês esquecem logo isso?’ – ele deve ter pensado. Mas o jogo já estava ganho, e ganhar música no grito, fora dos planos do artista, é sempre mais gostoso.

Foto: Daniel Croce

E sem bis, firula ou lero-lero encerram com o que seria a ‘Jumpin Jack Flash’ da banda, o power metal sem frescura intitulado “Waking the Demon”, onde Michael Paget sola feliz, sola bonito, sola futebol moleque. 

Não sei a quantas andam os números das vendagens de Gravity, só que confesso que nos 82 minutos de setlist eu até colocaria mais músicas do referido, como a faixa de abertura “Leap of Faith”, a já sacramentada pelo público gringo “Not Dead Yet” e aquela a qual para mim tem mais cara de BFMV, “Letting You Go”. O álbum não é ruim, funciona bem ao vivo misturado com os ‘crassicos’. Contudo, a tentativa de torná-lo mais comercial e friendly ao público do Bring Me The Horizon, fez com que Padge pagasse um preço alto por isso. Ao menos os vocais guturais permanecem com a ajuda providencial do baixista Jamie Mathias. Como experiência daquela velha conversa de ‘não queremos nos repetir’, pode se dizer que valeu. Mas subaproveitar um músico da tarimba de Michael não vale o esforço. 

Sea Smile

A abertura do show ficou por conta dos paulistanos do Sea Smile, na ativa há uns 10 anos. Ironia é que, de fato, o que vos fala já particularmente dividiu palco com eles no longínquo ano de 2012, na Planet Music, no bairro de Cascadura, Rio de Janeiro. Jogando em casa, a plateia reagiu bem durante a meia hora de show, onde a banda investiu 100% em um set autoral. Digo isso pois eles ficaram razoavelmente famosos pelos covers inusitados lançados no YouTube: “K.O” de Pablo Vittar e “Sua Cara”, da colaboração entre Major Lazer, Anitta e o já mencionado Pablo Vittar. Uma faca de dois gumes sua banda ganhar milhões de views, não pelo seu próprio material, mas por esse tipo de subterfúgio, ainda que ambas as versões tenham ficado muito legais (e talvez salvado as versões originais). Infelizmente, nenhuma das duas versões foi executada ao vivo. Paciência.

SETLIST BULLET FOR MY VALENTINE

1 – Don’t Need You
2 – Scream Aim Fire
3 – Your Betrayal
4 – Piece of Me
5 – 4 Words (To Choke Upon)
6 – You Want a Battle? (Here’s a War)
7 – Over It
8 – Venom
9 – Suffocating Under Words of Sorrow (What Can I Do)
10 – Drum Solo
11 – The Last Fight
12 – No Way Out
13 – Tears Don’t Fall
14 – Worthless
15 – Hand of Blood
16 – Waking the Demon

Confira a galeria de fotos do show:

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