Rock in Rio 2022 – Dia 02: primeiro dia do festival foi dedicado ao heavy metal

O encontro de veteranos e a nova geração do rock pesado despertou o melhor entre os dois mundos

Por Gustavo Franchini

A banda Bullet for My Valentine foi um dos destaques da noite

O Rock in Rio 2022 começou a todo vapor! Já no primeiro dia do festival tivemos shows dedicados exclusivamente ao rock pesado, levando um público bem considerável para a famosa Cidade do Rock. Contemplando tal homenagem a tantos estilos que se fizeram presentes naquele mesmo dia, os palcos Rock District, Espaço Favela e Supernova contaram com bandas brasileiras de renome no cenário (como Matanza Ritual, Crypta, Ratos de Porão e Oitão, dentre outras), em uma gama de vertentes que faria inveja a qualquer evento internacional de grande porte.

Palco Sunset

Black Pantera & Devotos

O palco estreou com o power trio mineiro Black Pantera, que já chegou quebrando tudo com sua sonoridade thrash/hardcore, percorrendo um setlist recheado de mensagens anti-preconceito, gerando uma identificação imediata com a plateia. Como é de se esperar no Sunset, que desde sempre proporciona encontros interessantes, a banda punk pernambucana Devotos, bastante conhecidos no estilo, se juntou à festa apresentando um espetáculo de união e amor pelo rock.

Fotos (Black Pantera & Devotos)

Metal Allegiance

E, pelo visto, as eternas rodinhas seriam o símbolo deste dia histórico, pois com a entrada da superbanda Metal Allegiance, como o próprio nome diz, sendo ‘fiéis ao heavy metal’, os integrantes de diversos conjuntos de sucesso, como Dream Theater, Testament e Exodus detonaram os amplificadores com músicas que representam bem toda a lealdade que os fãs tem para com o gênero. Em um total de dez sons devastadores, Mike Portnoy, Chuck Billy, John Bush e Jack Gibson deram aula e agitaram a todos.

Fotos / Setlist (Metal Allegiance)

Living Colour & Steve Vai

A próxima uma hora foi muito bem aproveitada com duas lendas vivas no palco: os estadunidenses do Living Colour e o guitar hero Steve Vai. Vale ressaltar que não é a primeira vez que se apresentam juntos. Em 2011, na Califórnia, fizeram uma homenagem digna à outra lenda; o mestre Jimi Hendrix. E agora, além de repetirem a saudação ao eterno guitarrista com a música “Crosstown Traffic”, outros artistas como Black Sabbath e Led Zeppelin foram reverenciados respectivamente através de um trecho da “Iron Man” e uma ótima versão de “Rock and Roll”. Com o carismático vocalista Corey Glover, dono de uma voz potente, mesmo com quase 60 anos de idade, ainda sendo capaz de alcançar notas altíssimas com muita qualidade, somado ao fato de que ainda foi para a plateia ao tocar o hit “Cult of Personality” no final do show, realmente não tem como dar errado. Uau!

Fotos / Setlist (Living Colour & Steve Vai)

Bullet for My Valentine

Talvez um dos shows mais aguardados pelo público juvenil da noite, o Bullet for My Valentine foi responsável por agitar os fãs do início ao fim. Chegou a ser inacreditável ver o desespero de emoção dos milhares que estavam presentes ali, abarrotando a passagem de tudo ao redor do Sunset para enaltecer as canções da banda galesa. O grupo formado por Matt Tuck nos vocais e guitarra, Michael Paget na guitarra, Jamie Mathias no baixo e Jason Bowld nas baquetas, simplesmente arregaçou os ouvidos de todos com seu metalcore animado e um setlist que, apesar de curto, foi o suficiente para deixar clara a mensagem de que eles vieram para ficar. Músicas como “Piece of Me”, “The Last Fight”, “Tears Don’t Fall” e “Scream Aim Fire” mostraram o por quê da banda atrair tantos seguidores.

Fotos / Setlist (Bullet for My Valentine)

Palco Mundo

Sepultura & Orquestra Sinfônica Brasileira

O tesouro nacional do thrash metal Sepultura, provavelmente a banda com maior número de participações no Rock in Rio, com seus quase 40 anos de estrada, desta vez resolveu fazer um show atípico no palco principal. Mesmo não sendo a primeira vez que experimentam a junção do metal com a música clássica, inclusive já tendo tocado com orquestra antes, o que tornou a apresentação única é que teve espaço para ambos os lados de maneira equilibrada; uma parte do repertório foi dedicada exclusivamente à músicas de Stravinsky, Beethoven e Vivaldi, com participação instrumental da banda, enquanto a outra foi recheada com a discografia do quarteto e arranjos de fundo da orquestra.

O desafio estava em conseguir equalizar bem duas sonoridades tão distintas em um palco enorme, reverberando em uma área aberta. Felizmente, tudo foi se ajeitando ao longo das músicas, tornando este um dos melhores momentos do dia.

Fotos / Setlist (Sepultura & Orquestra Sinfônica Brasileira)

O belíssimo encontro entre Living Colour e Steve Vai coroou o primeiro dia dedicado ao rock

Gojira

Tendo a missão de substituir o Megadeth no festival, os franceses do Gojira representaram o peso em forma de um death metal virtuoso de qualidade, que invadiu os corações dos presentes. Mesmo sabendo que logo em seguida viria a atração que mais atrai público da noite (Iron Maiden), ainda assim fizeram o seu trabalho de maneira admirável, sem aparentar qualquer tipo de nervosismo, considerando a situação como um todo. E tudo isso foi recompensado com a reciprocidade do público que se esforçou para acompanhar cada uma das músicas, batendo muita cabeça ao som das ótimas “Stranded” e “Silvera”.

Claro que não podemos deixar de mencionar o fato de que Joe Duplantier (vocalista e guitarrista), além de ter pintado o rosto com cores indígenas, ter feito um discurso contra as queimadas e tocado a música intitulada “Amazônia”, ainda convidou para o palco integrantes de povos indígenas.

Fotos / Setlist (Gojira)

Iron Maiden

E o grande momento chegou! Os veteranos ingleses do Iron Maiden, influência de praticamente todas as bandas de heavy metal pós anos 80, além de serem cultuados aqui como a maior referência do estilo de todos os tempos, pisaram no palco carioca pela primeira vez desde 2019 (na outra edição do Rock in Rio, por sinal), devido à pandemia que afetou o mundo inteiro. Como sempre, demonstraram total respeito aos fãs, se esforçando ao máximo para apresentar um espetáculo à altura da expectativa.

Há de se convir que não dá pra reclamar da banda realmente ter selecionado um setlist mais brando, visto que o vocalista e frontman Bruce Dickinson, aos 64 anos e depois de ter se recuperado de um câncer na língua/pescoço, mesmo apresentando um vigor e performance invejável para a idade, claramente sente dificuldades de cantar músicas que gravou há 40 anos, algo que todos nós já esperávamos, cedo ou tarde. É um milagre ele ainda estar cantando as músicas em seu tom original! Realmente precisamos valorizar a vontade dele de continuar fazendo shows e lançando novas músicas.

É necessário comentar que o andamento instrumental das músicas também estava mais lento, o que causou críticas por parte dos fãs. Contudo, não tirou o brilho do gênio Steve Harris, líder, compositor principal e um dos maiores nomes do baixo, o trio famoso de guitarristas Dave Murray, Adrian Smith e Janick Gers, e o exemplo da união entre carisma e técnica atemporal nas baquetas de Nicko McBrain. Todos músicos respeitadíssimos mundo afora. Acho importante destacar isso para que não sobre dúvidas em relação ao que eles representam para o estilo que tanto amamos e que somos sortudos de ainda termos a oportunidade de vê-los ao vivo tocando tantos clássicos.

Aliás, de clássicos a donzela de ferro entende bem. Com um setlist que, apesar de ter iniciado com três músicas seguidas do álbum mais recente, Senjutsu (2021), o que definitivamente não foi uma boa ideia, na sequência era um hit atrás do outro. A primeira da fase de ouro da banda veio de um dos melhores álbuns da carreira da banda, Piece of Mind (1983), a belíssima “Revelations”. Durante o show também marcaram presença mais duas do mesmo álbum: “Flight of Icarus” e “The Trooper”. O álbum de estreia do vocalista, The Number of the Beast (1982) também foi representado com três músicas; a que dá título ao mesmo, “Run to the Hills” e “Hallowed Be Thy Name”. E aí foi a transcendência de uma música de cada um dos álbuns, deixando de fora alguns que realmente não caberiam em um show deste porte (como a obra-prima Somewhere in Time, de 1986, que especula-se ser o principal foco da próxima turnê).

Realmente as décadas de experiência fazem com que a banda consiga ter o público nas mãos, que além de ter um vocalista que interage a todo momento com seus fãs, ainda conta com uma produção de palco que resume a grandiosidade do que é ver o Iron Maiden ao vivo. O mascote Eddie em diversas formas e tamanhos, a tela de fundo com a capa dos singles, todo o cenário remetendo a um tema de cada uma das músicas. E, óbvio, não poderia faltar os efeitos pirotécnicos, que fizeram brilhar os olhos dos presentes. Que sensação maravilhosa!

Um show desta magnitude é sempre um Best Of e, considerando que também ocorreram alguns problemas técnicos, deixando a altura do volume geral do som e mixagem do microfone abaixo do nível de um Rock in Rio, os problemas foram sendo contornados ao longo do setlist e, no final das contas, estavam todos se abraçando, felizes da vida por ter tido a sorte de ter visto os veteranos mais uma vez.

Fotos / Setlist (Iron Maiden)

Dream Theater

Concordando em trocar a ordem de apresentação com o headliner da noite, o ícone do metal progressivo Dream Theater preparou um show com duração menor do que o Scorpions fez em 2019 (ambos fizeram a mesma troca com o Iron Maiden), tocando apenas sete músicas. Isso desagradou alguns fãs que esperavam um setlist normal da banda que, de modo geral, dura em torno de duas horas, visto que as músicas do quinteto são conhecidas por terem longa duração. Ainda assim, para muitos foi considerado um dos melhores shows do primeiro dia!

Com vídeos bem produzidos no telão de fundo, cada uma das músicas se tornou uma viagem virtuosa para o teatro dos sonhos. Conhecidos há décadas pela técnica impecável, o trio John Petrucci (guitarra), John Myung (baixo) e Jordan Rudess apresentaram um espetáculo à parte. Notei diversas pessoas boquiabertas com a performance diante de seus olhos, realmente algo de outro mundo. Acredito que é uma das cozinhas mais poderosas de todo o metal mundial. Já o vocalista James LaBrie, que possui um belo timbre de voz em estúdio, às vezes peca ao interpretar as canções ao vivo, mas neste show em específico estava muito acima da média. Realmente surpreendeu muita gente! Completando a cozinha, o baterista Mike Mangini demonstrou muita precisão em linhas complicadíssimas, o que faz com que quase esqueçamos que o ex-baterista e fundador da banda estava no Sunset naquele mesmo dia.

Diferente dos shows que o Dream Theater fez no Brasil nos últimos dez anos, parece que dessa vez eles estavam mais afiados do que nunca para uma celebração especial, sólida e digna de sua discografia excelente. “Endless Sacrifice”, do Train of Thought (2003), fez com que até quem estava cansado de ter ficado o dia inteiro no festival, ainda assim conseguiu encontrar forças para se empolgar com tamanha grandiosidade de harmonias. Outro destaque ficou para “6:00”, do clássico Awake (1994), que agitou demais os fãs mais oldschool. Ter a audácia de tocar uma música com quase 20 minutos de duração e manter o público atento a todo momento é uma proeza que poucas bandas são capazes. E foi o que fizeram com “The Count of Tuscany”, do Black Clouds & Silver Linings (2009).

Só não dá pra ter um show do Dream Theater sem o hit máximo “Pull Me Under”, da obra-prima Images and Words (1992), né? E foi exatamente o presente que recebemos após o bis. Parece que acertaram em cheio ao fecharem a noite, pois permaneceram os verdadeiros fãs da banda ali (muito mais do que se esperava); era algo perceptível. Quanta nostalgia! Que venham mais vezes para a Cidade Maravilhosa.

Fotos / Setlist (Dream Theater)

Confira as fotos do primeiro dia (02/09) no Rock in Rio 2022:


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