Rock in Rio 2022 – Dia 08: quarto dia valorizou a diversidade de vertentes do rock

O pop, soul e hard rock se misturam em mais uma noite recheada de emoções

Por Gustavo Franchini

Jessie J encantou os fãs com sua voz poderosa e discursos motivacionais

O quarto dia do Rock in Rio (e o segundo dedicado ao rock) nos brindou com surpresas e shows de tirar o fôlego! Assim como no dia do heavy metal, todos os palcos secundários tinham atrações nacionais incríveis, o que tornou quase impossível a tarefa de acompanhar todos. No Supernova, por exemplo, tivemos Francisco, el Hombre e, no Espaço Favela, a banda Drenna (veja fotos e setlist aqui), ambas com um som de muita qualidade. O público compareceu em massa para um espetáculo da diversidade roqueira!

Palco Sunset

Duda Beat

E a prova da abrangência do festival começou com o pop da cantora Duda Beat, admirada por uma plateia abrangente que canta praticamente todas as músicas de sua curta carreira (iniciada com o lançamento do primeiro álbum solo em 2018). Já considerada uma diva da música brasileira, a recifense interage muito bem com todos e conquista cada vez o espaço na cena pop ‘sofrência’, com músicas como “Pro mundo ouvir”, “Bédi Beat” e “Dar uma deitchada”.

Fotos / Setlist (Duda Beat)

Gloria Groove

O lado nacional do Sunset continua com o pop e hip hop da drag queen Gloria Groove, que arrastou uma multidão de admiradores pelo seu estilo performático, bastante teatral, ao apresentar suas músicas e covers. Falando em covers, foram boas escolhas com “Máscara” (Pitty), “Exagerado” (Cazuza) e um trecho de”Malandragem” (Cássia Eller), apesar se as duas primeiras se transformarem em versões diferentes, mas que combinam com o som do cantor.

Fotos (Gloria Groove)

Corinne Bailey Rae

A primeira surpresa da noite chegou com a maravilhosa cantora britânica de soul music, Corinne Bailey Rae, uma verdadeira joia musical. Em tom intimista e que abraça a plateia, esbanjou simpatia e talento com seu setlist praticamente autoral, com exceção de sua versão para “Is This Love” (Bob Marley). Um momento único que levou paz para todos os presentes, que praticamente oravam em agradecimento pela suavidade de cada palavra que era cantada naquele palco. Sem sombra de dúvidas, o melhor show do Sunset!

Fotos / Setlist (Corinne Bailey Rae)

Jessie J

E se tem uma artista que ficou coladinha na posição de melhor show, seria justamente a headliner, também britânica, super respeitada no seu estilo: a cantora Jessie J. Já conhecida por aqui, principalmente após a passagem pelo festival em 2019, substituindo Joss Stone, desta vez dividiu opiniões. Não pela música, sempre impecável, mas sim pelos discursos. Não pelo conteúdo dos discursos, mas a frequência que interrompia o show para falar sobre assuntos que são sim importantes, contudo atrapalhavam o ritmo da apresentação. Muitas pessoas gritavam “canta!” em tom bem humorado, enquanto ela discursava sobre questões motivacionais, o que tornou tudo um pouco fora da caixinha.

Sua voz poderosa e, ao contrário de muitos artistas pop, sem uso de playback ou autotune ao vivo, sua atitude bem ‘prafrentex’, seu repertório 100% autoral (com um breve trecho de “Sex Machine”, de James Brown, levando todos a dançarem), ainda assim não foram suficientes para evitar tal situação. Jessie pediu para uma fã tirar seu sapato (literalmente), chamou a sua equipe para participar de uma das canções, falou que “Price Tag” era dedicada a todos menos aos que vieram só por essa música (?). Foi um show, de fato, diferenciado!

Fotos / Setlist (Jessie J)

Palco Mundo

CPM 22

O palco principal começou bem agitado com a presença de uma banda de emo cultuada no país, CPM 22. Trazendo canções que nos leva à memórias adolescentes, emoções impactantes que eram transformadas em sentimentos tanto chorosos quanto alegres, hoje em dia é motivo de sorriso constante, seja com o hit “Um minuto para o fim do mundo” ou “Dias atrás”, uma época que parece estar no passado, mas que continua forte no presente. O vocalista Badauí interage muito bem com a plateia e realmente fez todos pularem sem parar, aliás, um fenômeno que sempre acontece em seus shows.

Fotos / Setlist (CPM 22)

Guns N’ Roses celebra carreira com clássicos entoados a plenos pulmões pelo público

The Offspring

Falando em fenômeno, realmente fica até difícil de descrever a sensação que é estar em um show dos veteranos do The Offspring. Um dos pioneiros no movimento pop punk rock no mundo, com canções que tem riffs e melodias vocais super pegajosos, os californianos apresentam um verdadeiro espetáculo ao vivo. O lendário vocalista e guitarrista Dexter Holland, junto com seu companheiro de instrumento conhecido apenas como Noodles, formam uma das duplas mais criativas da história do rock. O restante da banda que os acompanha é muito competente, o que faz com que o show seja uma verdadeira homenagem ao espírito jovem que está dentro de todos nós.

Claro que não há como negar que as músicas estavam sendo tocadas em tons mais baixos e que Dexter (com seus 56 anos de idade) já não consegue cantar com a maestria de outrora, muito menos com seu drive e punch insanos, que se tornaram uma marca registrada pela originalidade. Mas isso não atrapalhou em absolutamente nada, pois a força das músicas estava lá presente a todo momento, o público soube cantar todas as músicas; a felicidade estampada no rosto de cada um. Algumas pessoas choravam e sorriam ao mesmo tempo!

Como não se mexer com músicas no calibre de “Staring at the Sun”, “Come Out and Play”, “Hit That”, “Bad Habit”, “Gotta Get Away”, “Why Don’t You Get a Job?”, “Pretty Fly (for a White Guy)”, “The Kids Aren’t Alright”, “Self Esteem”, dentre outras, em uma lista quase que interminável? São muitos sucessos, músicas feitas pra cantar com os amigos, ‘música de galera’, com seus “hey”, “ho”, sem forçar a barra, de maneira orgânica. A única banda que se equipara ao The Offspring neste quesito é uma que falaremos na resenha do próximo dia (e vocês já devem imaginar quem é).

Um exemplo de como ter o público nas mãos, de maneira respeitosa, fazendo com que, pelo menos por alguns minutos, todos se abraçem e as diferenças se tornem inexistentes. As zoeiras do guitarrista Noodles só foram a cereja do bolo, que já estava delicioso. Ainda que tenha faltado alguma música do excelente Ixnay on the Hombre (1997), realmente é compreensível, pois são muitas músicas para um setlist curto de festival. E olha que foram 15 músicas tocadas uma seguida da outra. Passou tão rápido e ninguém da plateia sentiu a duração de mais de 1 hora de show. Vida longa ao quarteto!

Fotos / Setlist (The Offspring)

Måneskin

Confesso que estava curioso para ver o show dos italianos do Måneskin e seu hard rock palpado em uma atitude quase que rebelde. Tinha a expectativa de um show animado, mas o que presenciei foi um show um tanto quanto estranho. Afinal, é uma banda que fez seu nome com um cover (“Beggin'”, do grupo musical The Four Seasons, sucesso na década de 60), então parte do público nem sequer sabia cantar suas músicas. Mesmo com o esforço contínuo do vocalista Damiano David em interagir com todos, puxando coros e correndo de um lado pro outro, além da simpatia da baixista Victoria de Angelis, que com certeza foi o destaque do show, em determinado momento o clima se tornou morno.

Talvez o principal motivo tenha sido a escolha de “Love of My Life”, uma clássica e linda canção do Queen, mas que na versão deles ficou algo bem aquém do esperado, para não dizer amador. De fato nenhum dos elementos se encaixou, principalmente na linha vocal que, com o perdão da palavra, se transformou em ‘vergonha alheia’. O mesmo aconteceu com “My Generation” (The Who), fazendo inclusive com que algumas pessoas se deslocassem para fora do show e, percebendo tal movimento, o frontman chegou a falar que em breve sairiam do palco para a entrada da banda que todos estavam aguardando (se referindo ao Guns N’ Roses).

Foi ótimo ver que no final do show alguns fãs subiram ao palco para dançarem com a banda, recuperando a energia positiva que era forte no começo do repertório, encerrando de uma maneira mais agradável. Espero que a banda lance mais material de qualidade, de preferência autoral, para assim ganharem mais respeito no cenário, pois talento parecem ter de sobra!

Fotos / Setlist (Måneskin)

Guns N’ Roses

E como o melhor muitas vezes fica para o final, a Cidade do Rock parou para contemplar os norte-americanos do Guns N’ Roses, que lançaram de fato apenas três álbuns marcantes, mas bons o suficiente para se tornarem parte da história. O mais puro hard rock estava diante de meros mortais que se curvavam diante dos deuses que prostavam naquele imenso palco. Milagrosamente sem atraso, Axl Rose e Cia surgem sob iluminação muito bem trabalhada para despejar um mar de hits. Só que as coisas não saíram exatamente como todos desejavam. E por que?

A resposta é simples: o vocalista há muito tempo não consegue cantar à altura do que gravou nas décadas de 80/90. Desde que ressurgiu no Rock in Rio de 2001, todos questionavam a sua voz. Mesmo tendo feito um excelente trabalho ao substituir temporariamente Brian Johnson no AC/DC em 2016, elogiado por muitos, parece que em sua própria banda não faz muita questão de ter a melhor performance possível. Esta é a impressão que passa. Não afirmando que foi por falta de tentativa durante as músicas, pois realmente ele se esforçava para sempre estar cantando no tom original, demonstrando simpatia e respeito para com todos, só que simplesmente parecia não estar preparado no aspecto físico para tal tarefa. Afinal, a voz é um instrumento que precisa ser afinado, cuidado e praticado, como todos os outros.

O show teve altos e baixos; em algumas canções, Axl (aos 60 anos de idade) consegue cantar trechos com sua voz característica que é a identidade do Guns N’ Roses. O melhor exemplo foi na bela balada “Patience” (que fora precedida por uma introdução de “Blackbird”, do The Beatles), após o bis, que ele foi superior em relação à todas as outras, deixando o público com aquele gostinho saudoso de ‘quero mais’. Ainda assim, por conta do ótimo desempenho do lendário guitarrista Slash (destaque absoluto com seus solos dignos do guitarhero que é), o baixista Duff McKagan e o tecladista Dizzy Reed, que estavam na formação da era de ouro da banda, o show conseguiu se sustentar, somado com a produção de palco que estava bem interessante.

O guitarrista Richard Fortus fez também um trabalho sensacional e a tecladista Melissa Reese, nos poucos momentos em que aparece (mais reforçando vozes do que tocando), me pareceu boa o suficiente. Contudo, por outro lado, me incomodaram bastante as linhas de bateria de Frank Ferrer, muitas vezes me dando a impressão de estar tocando bem diferente do ritmo original, sem pegada, um som seco e com pouca criatividade. Com certeza alguns problemas técnicos no som e o volume baixo que, mais uma vez, se tornou evidente no Palco Mundo, contribuíram para apagar um pouco a apresentação.

Com tudo isso dito, apesar dos defeitos, o Guns N’ Roses ainda consegue emocionar os fãs. Não tem como não pular, cantar e sorrir quando os ouvidos são presenteados com “Welcome to the Jungle”, “Estranged”, “You Could Be Mine”, “November Rain”, “Nightrain”, dentre tantas outras. O setlist definitivamente foi muito bem escolhido, mostrando trabalhos recentes e respeitando o passado, sabendo que a maioria estava lá para ouvir os clássicos. Um momento lindíssimo ocorreu durante a execução de “Knockin’ on Heaven’s Door” (cover de Bob Dylan), no qual Axl surge com uma camisa e chapéu representando a bandeira britânica, em homenagem à Rainha Elizabeth II, que tinha falecido no mesmo dia.

No final das contas, foi realmente um ótimo show com aproximadamente 2 horas de duração, mas que deixa bem claro que a banda precisa estar mais afiada para a próxima turnê e Axl precisa retomar suas aulas de canto, tratamentos para as cordas vocais etc. Seu legado jamais será esquecido, mas os fãs gostariam de mais material novo de qualidade, mais belas apresentações como as que sabemos que são capazes, enquanto ainda estão na ativa. Que venham mais vezes para cá!

Fotos / Setlist (Guns N' Roses)

Confira as fotos do quarto dia (08/09) no Rock in Rio 2022:


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