O carisma do Blind Guardian supera calor escaldante em show emocionante com repertório misto para público no Rio

Por Gustavo Franchini

Foto: Carla Cristina

Os bardos mais carismáticos do power metal voltam ao Brasil para uma extensa turnê denominada The God Machine, relacionada ao álbum homônimo lançado ano passado, passando por diversas cidades. O público carioca foi agraciado desta vez, ansiosos pela performance espetacular da banda no festival Summer Breeze, em São Paulo, que ocorreu em abril, no qual na oportunidade chegaram a tocar o belíssimo Somewhere Far Beyond (1992) na íntegra. Para esta apresentação, perto de completarem 40 anos de carreira, o Blind Guardian optou por fazer uma verdadeira ‘mistureba’ de canções de diversos álbuns em um setlist que agradou grande parte dos que estavam presentes.

Devido ao calor no Rio de Janeiro, primeiramente é importante ressaltar que a escolha do local não foi a mais apropriada. O Circo Voador, apesar de já ter sido palco de muitos shows de relevância na cidade, inclusive de heavy metal, ainda assim não tem o espaço suficiente para abraçar os fãs que compareceram em peso no evento, praticamente lotando o espaço a ponto de não ter como se posicionar para assistir de maneira devida aos alemães no pequeno palco. Pela própria arquitetura da casa, os que não conseguiram se acomodar em um lugar decente antes da apresentação, simplesmente tiveram que se contentar em ver o show através de pilastras e pés de pessoas que estavam na parte de cima. Tinham pessoas sentadas na escada que dá acesso ao setor superior que, devido a estar abarrotado de indivíduos com suas respectivas camisas pretas, se tornou praticamente impossível ousar se posicionar ali naquela região. Fora isso, não há ar-condicionado por conta de ser um local semi-aberto (o que foi amenizado naturalmente por uma pancada de chuva minutos antes) e, também por conta deste fator, músicas de locais próximos ao Circo são ecoados nos intervalos do show, tirando um pouco a imersão. Casas que já foram palco para a banda, como Fundição Progresso e Vivo Rio, seriam mais apropriadas para a ocasião. Dito isso, tal escolha não chegou a atrapalhar a noite, que estava temperada com a magia que só os alemães são capazes de invocar.

Os gritos de “olê, olê, blindê” se mostraram presentes a noite inteira, como já esperado em shows dos alemães em terras brasileiras. E, logo nas primeiras notas, o público foi à loucura com a clássica e potente “Imaginations From the Other Side”, não só uma das melhores canções da vasta discografia do Blind Guardian, mas também a música de abertura que leva o nome de um dos maiores álbuns da história do power metal, que foi lançado em 1995 para mudar a indústria do gênero para sempre. Outra que também se fez presente do mesmo foi a agressiva e melódica “The Script for My Requiem”, que testou os limites vocais do simpático vocalista Hansi Kürsch, que com seus quase 60 anos (57 pra ser preciso) teve a todo momento a plateia nas mãos. Entre as duas músicas, uma do álbum mais recente, “Blood of the Elves”, com seu peso e harmonias distintas, se mostrou uma grata surpresa, além de um dos hits que sempre marcam presença nos shows do quinteto, a maravilhosa “Nightfall”, tendo o refrão cantado a plenos pulmões por todos, remetendo ao tema que os fãs amam, ou seja, as histórias fantásticas do autor J.R.R Tolkien com suas obras-primas da literatura que são sempre citadas nas músicas da banda.

Outra canção recente tocada aqui que já tinha sido bem recebida pelo público no Summer Breeze foi a “Violent Shadows”, seguida de um momento mais tranquilo com a ótima balada “Skalds and Shadows”, do injustamente pouco lembrado A Twist in the Myth (2006). Eis que chegou a hora de voltar ao passado glorioso com a sensacional “Time Stands Still (At the Iron Hill)”, que fez a casa tremer diante de tantos pulos, gritos e headbanging. Para acalmar os ânimos, outra que remete à turnê, “Secrets of the American Gods”, que com um excelente refrão e uma pegada instrumental interessante, fez com que todos praticamente esquecessem que o melhor ainda estava por vir.

Chegou o momento de se emocionar, banda e público se unirem em prol de um único objetivo: cantarolar em volta de uma fogueira virtual como verdadeiros bardos para o maior sucesso do Blind Guardian. Talvez a balada que melhor representa a temática do gênero e todo o conceito em torno das letras. Sim, os cariocas foram agraciados com “The Bard’s Song – In the Forest”, provavelmente o auge da noite. Chega a ser curiosa a conexão imediata que é criada a partir dos primeiros acordes dos guitarristas André Olbrich e Marcus Siepen, que aliás foram os destaques do show.

Foto: Carla Cristina

Com uma cozinha bem entrosada, completada pelo baterista Frederik Ehmke (que em certo momento do show gentilmente cedeu uma garrafa d’água para um fã próximo ao palco), além dos músicos convidados Johan van Stratum (baixo) e Michael Schüren (teclados), o que deu pra perceber é que havia um esforço para superar problemas técnicos no som. O microfone de Hansi estava com um volume baixo, então, durante alguns trechos de versos das músicas simplesmente não dava pra ouvir sua voz, apenas quando uma frequência mais aguda era emitida ou nos intervalos. Já a bateria estava com uma sonoridade estridente e sem ‘punch’, enquanto que o teclado era praticamente inaudível. É necessário deixar claro que, com exceção das guitarras, muito bem timbradas e balanceadas, somado ao som do baixo que estava aceitável, o restante dos instrumentos sofria com tais questões mencionadas que nunca rolou em nenhum dos outros shows da banda. Felizmente, foram levemente ajustados ao longo da apresentação e não chegaram a impactar o suficiente para prejudicar o espetáculo.

Uma das queridinhas dos fãs veteranos, “Majesty”, do primeiro álbum da banda (Battalions of Fear, de 1988), anunciava que viriam mais clássicos por aí. E, sim, tivemos “Traveler in Time” para a surpresa de muitos, canção do Tales from the Twilight World (1990) que finalmente é tocada por aqui após 12 anos de ausência. Após uma breve pausa, surge o bis com um petardo atrás do outro. A épica “Sacred Worlds”, única do At the Edge of Time (2010), serve como prenúncio para “Lord of the Rings”, outra do Tales que dispensa comentários, absolutamente cantada em uníssono. Interação de cair o queixo entre público e músicos, de fato uma das grandes qualidades do Blind Guardian.

E a ‘pedido do público’ (já que é uma das músicas que estão no setlist padrão da turnê), a sensacional “Valhalla”, que com seu riff característico, além de um refrão que levanta qualquer um mesmo no calor escaldante, abre caminho para reais solicitações da plateia (“Into the Storm”, no caso), mas que não rolaram desta vez, provavelmente pela banda não ter tido tempo de ensaiar. No lugar foi tocada outro clássico, “Welcome to Dying”, o que agradou do mesmo jeito, encerrando com a responsável por grande parte dos fãs ter conhecido a banda, a absoluta e única “Mirror Mirror”, que definiu a entrada dos alemães no hall de fama do power metal. Vida longa aos bardos!


Veja galeria de fotos do show (Blind Guardian/ RJ):



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