Por Gustavo Franchini

O domingo no Bangers Open Air seria ainda mais diversificado no quesito gêneros dentro do heavy metal, agradando a todos e o clima de São Paulo ajudou muito com sua temperatura amena, sem chuvas e o sol característico próximo ao horário do almoço, algo que se tornou quase como uma marca registrada do evento. O público presente foi praticamente o mesmo do sábado, ou seja, a galera compareceu em peso para conferir grandes nomes e também, nos intervalos, aproveitar a variedade da praça de alimentação com seus food trucks, comprar itens na Horror Expo ou loja medieval, ou quem sabe uma camiseta oficial da sua banda favorita e mesmo as do festival? Até quem queria fazer uma tattoo teve oportunidade. E a criançada não ficou de fora com o Espaço Kids que ajudou os casais metaleiros a levarem toda a família sem nenhuma preocupação.
Confira vídeos dos shows na seção ‘Destaques’ do Instagram
Neste terceiro dia tivemos a cobertura das bandas Lord of the Lost, Hatefulmurder, Dorsal Atlântica, Paradise Lost, Kamelot, Haken, Hibria, Blind Guardian, W.A.S.P. e Avantasia.
Sun Stage
Dorsal Atlântica
Certamente uma das pioneiras da cena thrash metal brasileira, o Dorsal Atlântica desde o início da década de 80 estampa a capa das principais publicações nacionais, inclusive nos tempos idos de Planet Metal, que reunia canções de grandes nomes de diversos gêneros. Depois de um hiato que durou aproximadamente 10 anos, o vocalista/guitarrista Carlos Lopes retoma a banda em 2012 e a partir daí foram lançados álbuns de boa repercussão, mesmo enfrentando o falecimento de alguns integrantes.
Em uma apresentação relativamente politizada, enérgica e até com certo toque de humor, pois convenhamos que é difícil levar 100% a sério a guitarra estilo trio elétrico do frontman (até perde certo peso ali pelo corpo do instrumento), o disco de estreia Antes do Fim (1986) se fez presente com músicas como “Caçador da Noite” e “Guerrilha”, além do destaque em “Vitória”, do segundo álbum, Dividir e Conquistar (1988), dentre outros que levantaram o público que estava bem recíproco. Viva o metal nacional!
Fotos (Dorsal Atlântica)
Haken
O prog metal não estava sendo bem representado o suficiente nesta edição, então o Haken veio para simplesmente dominar o evento inteiro. Com elementos de jazz, música erudita, folk e uma cozinha absurda de boa, mesmo sendo uma banda até recente, formada em 2007, o sexteto inglês fez um show impecável, no qual era possível ver pessoas boquiabertos no público, sem exageros. Ou será que deveríamos chamar de art metal?
A postura do vocalista Ross Jennings, que além de seu talento óbvio ainda se apresenta de maneira orgânica, sem forçar a barra com interações ou puxar coros desnecessários, é um exemplo de como ser um cantor do gênero. Richard Henshall e Charles Griffiths reproduziram as linhas de guitarra como se estivessem em estúdio de tão perfeitas. O baixista Conner Green, que entrou após a saída de Tom MacLean em 2013, mostra total segurança nos graves, o que impressiona e muito pela complexidade de performar ao vivo tantas frases intrincadas, além de uma base segura (vide “Carousel”). Peter Jones mostra que o teclado não é só background em bandas que sabem utilizar bem todas as suas nuances, e a criatividade de timbres escolhidos surpreendeu aos curiosos que ainda não conheciam o som do Haken. Raymond Hearne simplesmente destrói nas baquetas, como sempre, virtuosismo fora da realidade e viradas inspiradas. Em resumo, um verdadeiro dream team!
A melodia dos refrãos com notas alargadas que Jennings faz questão de deixar soar, somado a backing vocals bem harmonizados, transformam tudo em algo original e que transcende as barreiras do gênero, gerando uma gama de emoções. Canções espetaculares como a pesada “Prosthetic” e a estética cativante de “Falling Back to Earth” são bons exemplos. Voltem mais vezes pra cá que serão recebidos de braços abertos pelo público brasileiro!
Fotos (Haken)
Waves Stage
Hatefulmurder
Os cariocas do Hatefulmurder, que fazem um death metal melódico que está chamando bastante a atenção pelos lançamentos bem trabalhados, como o mais recente I Am That Power (2024), tiveram a oportunidade de apresentar um pouco da sua discografia de mais de uma década em um show que contou com um público considerável e até participação da Mayara Puertas (Torture Squad).
A cozinha formada pela vocalista Angélica Burns, o guitarrista Renan Campos, o baixista Felipe Modesto e Thomás Martin na batera, não só está bem entrosada, como também tem ótima performance ao vivo. Burns, que tem muita potência e técnica, busca sempre interagir com todos. “Call Out Your Soul”, “Creative of Sorrow” e “Reborn” são os destaques. Mereciam um palco maior!
Fotos / Setlist (Hatefulmurder)
Hibria
O metal nacional realmente está a todo vapor, e os gaúchos do Hibria são a prova disso. Com seu speed/power metal bem técnico, de altíssimo nível, mesmo com nova formação após a saída do vocalista Victor Emeka e o baterista Otávio Quiroga, tudo parece funcionar da maneira adequada. A entrada de Angelo Parisotto e William Shuck trouxe um ar de renovação que se encaixou muito bem, e o show se manteve equilibrado nas nove canções apresentadas.
Focando praticamente no primeiro álbum da banda, Defying the Rules (2004), e apenas uma canção do The Skull Collectors (2008), a plateia estava empolgada e ocupou bem o espaço do Waves mesmo sendo em horário que competia com Blind Guardian, Haken e Kerry King. Tá certo que Parisotto dá umas exageradas nos agudos de vez em quando, mas é compreensível querer impressionar para conseguir seu lugar merecido como cantor em uma indústria tao competitiva. Destaque para a abertura com “Steel Lord On Wheels” e a sensacional “Millennium Quest”.
Fotos / Setlist (Hibria)

Haken – Foto: Vic Heloise
Ice/Hot Stage
Paradise Lost
Se teve uma banda que foi escalada no horário errado, podemos ter certeza de que o topo da lista ficou com o Paradise Lost, um dos grupos mais aguardados por todos deste dia do festival. Sendo um dos pioneiros no gênero doom/gothic metal, aliando o alternativo, extremo, dark e resultando em uma sonoridade única, desde o final da década de 80 e influenciando tantas outras bandas posteriores de renome, tocar às 14h05 de um domingo com sol fervilhando e ainda necessitando de ajustes no som do palco (o bumbo da bateria de novo no PA, como ocorreu em outros shows), realmente se tratou de uma injustiça ao legado que eles representam.
Bandas como o Lacrimosa tocaram à noite em um palco reservado para os corações tristonhos, então se conclui que o mesmo deveria ter sido aplicado ao Paradise Lost, já que é difícil entrar na atmosfera necessária para se envolver no som deles se o ambiente não ajuda. Ainda assim, isso tudo não chegou a atrapalhar o suficiente para que a apresentação fosse um desastre, muito pelo contrário, se tornou um dos destaques do dia.
Praticamente com a mesma formação desde o álbum de estreia (com exceção do baterista Guido Zima Montanarini, que entrou em 2016, aliás, a banda é quase que recordista em mudar bateristas, já que tiveram outros cinco anteriormente e mais dois temporários em turnês), o vocalista Nick Holmes, os guitarristas Gregor Mackintosh e Aaron Aedy, junto com o baixista Steve Edmondson, representam uma das cozinhas mais seletas do mundo do metal.
Com uma vasta discografia que abrange diversas experimentações musicais ao longo das quase quatro décadas de existência, a tarefa para selecionar um setlist de apenas 1 hora de duração se tornou de fato hercúlea. Não tem como ignorar álbuns como a obra-prima Draconian Times (1995), que contou com “Enchantment” e o auge com “The Last Time”, ou hits como “As I Die” e a famosa versão cover do Bronski Beat, “Smalltown Boy”, e claro, “Say Just Words”. Do excelente Gothic (1991), provavelmente o disco mais influente de todos e que ajudou a moldar o gothic metal a partir dali, só rolou a “Eternal”. Que voltem ano que vem para um repertório completo!
Fotos / Setlist (Paradise Lost)
Kamelot
Caro leitor, você não está com problema de vista ou a redação errou na digitação. Sim, o Kamelot tocou dois dias seguidos, mas por um motivo inesperado: tiveram que substituir às pressas o I Prevail que de última hora teve que cancelar sua apresentação. Prometendo um setlist diferente do sábado (que não foi tanto assim, já que pelo menos metade se manteve), a dedicação do vocalista Tommy Karevik, a presença ainda mais contante de Adrienne Cowan e Melissa Bonny, além do respeito do público que fez de tudo para tornar aquele momento tão legal, fez com que tudo desse muito certo.
Já de cara o destaque vai para “Sacrimony (Angel of Afterlife)”, do Silverthorn (2012), que contou com as duas cantoras ao mesmo tempo e isso potencializou toda a força da canção. Uma honra poder assistir dois shows seguidos de uma banda tão icônica. “Phantom Divine (Shadow Empire)” do The Shadow Theory (2018) botou pra quebrar, e sobrou até espaço para “Center of the Universe” do conceitual Epica (2003), dentre outras distintas do primeiro show, que contou com 10 músicas ao total (no sábado foram 12). Senti falta de alguma do ótimo The Fourth Legacy (1999), mas não se pode ter tudo, não é mesmo?
O fato é que o Kamelot ganhou ainda mais fãs por conta da atitude e entrega máxima diante de toda a situação, e isso nós brasileiros não esqueceremos. Podem voltar o quanto antes!
Fotos / Setlist (Kamelot)
Lord of the Lost
Uma das revelações da edição do ano passado, quando o festival ainda se chamava Summer Breeze Brasil, os alemães do Lord of the Lost deram um upgrade do Sun para o Hot Stage devido à recepção tão positiva do público brasileiro. É difícil se manter distraído diante do empolgante gothic metal industrial com música eletrônica do quinteto, que é super adequado para ser tocado ao vivo.
Na oportunidade de executar um setlist um pouco diferente, mas com praticamente o mesmo número de canções (de 14 para 13, se comparado ao show anterior aqui no Brasil), algumas se fizeram presentes novamente por terem se tornado atuais favoritas, como “Loreley”, “The Future of a Past Life” e “Blood & Glitter”, dentre outras. O problema técnico que gerava pressão no PA com o bumbo da bateria apareceu durante as primeiras músicas, mas foi melhorando ao longo do tempo.
O vocalista Chris Harms (que também é guitarrista) tem ótima presença de palco e consegue levantar a galera que chegou cedo pra acompanhar desde o início o evento. Mesmo com o forte calor, a banda não parava de agitar e conseguia manter o público animado durante todo o tempo. Sempre bom conhecer novas (e boas) bandas em festivais como o Bangers Open Air!
Fotos / Setlist (Lord of the Lost)
W.A.S.P.
Celebrando os 40 anos do disco homônimo de estreia (de 1984), o W.A.S.P. mostrou todo seu hard/shock rock mesclado com glam metal, só que desta vez, diríamos que mais comportados. Isso porque o frontman, vocalista e guitarrista Blackie Lawless, que já foi uma figura extremamente polêmica durante toda a sua carreira, parece que agora que se converteu ao lado cristão conservador, se acalmou um pouco. Aliás, é o único remanescente da formação original.
Se tem uma coisa que ele sabe fazer é escolher bem os integrantes, pois o guitarrista Doug Blair é competente a um nível fora do normal, enquanto Mike Duda no baixo é um pouco mais tímido, mas faz o seu trabalho dentro do esperado. Só que não podemos deixar de falar sobre o nosso querido Aquiles Priester na batera, que já completou 8 anos na banda e é o motivo maior para que o público lotasse o Ice Stage. E tudo se tornou ainda mais memorável pelo maravilhoso discurso (escolhido por ele, segundo o próprio, que poderia ter feito o tradicional solo, mas preferiu falar com o público, ou melhor, “com o meu povo”), que deixou claro o quanto aquele show era importante pra ele, em um palco de um festival tão grandioso e todo o carinho dos brasileiros a todo momento. Foi lindo demais!
Claro, rolaram vocais pré-gravados em alguns refrãos, uma produção de palco mais modesta, na qual contou com telão que rolavam vídeos da era antiga, divertidos e assustadores ao mesmo tempo, mas o que importava é que no final cada alma viva estava ali cantando, dançando e abraçando o real entretenimento que todos os shows deveriam nos proporcionar. Impossível ficar parado ao som de “I Wanna Be Somebody”, “Tormentor”, “Forever Free/ The Headless Children” e “Wild Child”.
Fotos / Setlist (W.A.S.P.)

Avantasia – Foto: Vic Heloise
Blind Guardian
Uma das atrações principais da edição anterior e sucesso total de público toda vez que pisa em solo brasileiro, os bardos do Blind Guardian voltaram ao país mais cedo do que esperávamos, devido à substituição das bandas Knocked Loose e We Came as Romans (que também contou com Destruction no mesmo dia). E nós só temos que responder com um ‘muito obrigado’!
No anúncio oficial a banda prometeu um setlist especial com os maiores hits, mas o que ocorreu foi algo melhor ainda: canções espetaculares como “Mordred’s Song” e “Tanelorn (Into the Void)”, que não eram tocadas há pelo menos 8 anos, deram as caras para simplesmente enlouquecer a todos. A realidade é que um terço foi representado por músicas da verdadeira obra de arte que resolveram chamar de Imaginations from the Other Side (1995), considerando por muitos como um dos melhores álbuns de power metal da história, em canções como a faixa título (que teve uma introdução diferenciada), “Bright Eyes” e “And the Story Ends”.
E os alemães que nem ousem deixar de tocar alguma do Nightfall in Middle-Earth (1998), portanto tivemos “Into the Storm”, “Time Stands Still (At the Iron Hill)” e o hit máximo “Mirror Mirror”. Álbuns mais recentes como The God Machine (2022) também foram contemplados, e justamente as duas melhores, “Blood of the Elves” e “Violent Shadows”. Show do BG não é show do BG se não tiver “Valhalla” e “The Bard’s Song (In the Forest)” (que curiosamente o público se atrapalhou ao sincronizar o canto com o violão), então as duas tiveram a recepção mais calorosa dentre todas. E sim, Hansi continua sendo um dos frontman mais carismáticos da história do metal mundial. E a dupla de guitarras André Olbrich e Marcus Siepen, além da criatividade divina, são tão sincronizados que chega a dar arrepios. Já Frederik Ehmke na batera e o baixista Barend Courbois (no caso este é músico convidado) desempenham seu papel de maneira bem sólida. Show do Blind Guardian é sempre especial. Emocionante. Voltem sempre!
Fotos / Setlist (Blind Guardian)
Avantasia
Nem o vocalista e fundador Tobias Sammet talvez tenha sido capaz de vislumbrar um futuro tão brilhante para um projeto solo. Ao criar o Avantasia no final da década de 90, enquanto mantinha o Edguy, o objetivo era juntar vocalistas que eram seus amigos dentro da cena e outros que considerava talentosos em músicas de cunho épico, algo grandioso, diferente do que se tinha na época. E o resultado não poderia ser melhor, já que o sucesso se estende até os dias de hoje ao redor do mundo.
Claro que isso só foi possível com canções de muita qualidade dentro de um gênero já saturado, mas que sempre teve espaço para mais. E o carismático frontman conseguiu fazer isso. E ainda o faz. Some isso tudo a uma produção de palco de primeiro nível, com muito pirotecnia, iluminação e efeitos que agregavam e muito às músicas. Sempre ao lado de seu parceiro Sascha Paeth nas guitarras, o número de participações varia de show para show, mas o deste festival foi caracterizado pela variedade de estilos.
A lista é a seguinte: Herbie Langhans (Firewind e ex-Seventh Avenue) em “Devil in the Belfry”, Eric Martin (Mr. Big) em “Dying for an Angel” e “Twisted Mind”, que também contou com Ronnie Atkins (Pretty Maids). Daí rolou a galera do Kamelot com Tommy Karevik em “The Witch” e Adrienne Cowan (Seven Spires) em “Reach Out for the Light”. A belíssima Chiara Tricarico (Moonlight Haze) surgiu em “Farewell”. E o melhor por último; Jeff Scott Soto em “Shelter from the Rain”!
No setlist, o álbum que mais apareceu foi The Scarecrow (2008), seguido do mais recente Here Be Dragons, que foi lançado este ano, e o de estreia The Metal Opera (2001). O curioso é que ao anunciar “Avalon”, Tobias brinca com a plateia sobre a falta de empolgação com canções de um disco novo (algo muito comum de acontecer), e que se as pessoas querem que uma banda volte a tocar no país delas, seria legal pelo menos ‘fingir’ que estão animadíssimos. Resumo da ópera: pediu para todos gritarem a plenos pulmões durante o anúncio da música, o que foi um dos momentos mais engraçados desta linda apresentação.
Um espetáculo do Avantasia é garantia de festa, então todos ali estavam super confortáveis em fazer piadas, interagindo durante cada minuto, aplaudindo, gritando, pulando, pedindo músicas, fazendo coros clássicos de “ole ole ola” e no final das contas, todos os convidados se reuniram no palco novamente para “Sign of the Cross/ The Seven Angels”.
E assim se encerra mais uma edição do festival que veio para ficar, reuniu headbangers de todo o Brasil e foi exemplo de organização. Parabéns a todos os envolvidos e que a cada ano tudo se torne ainda melhor!
Fotos / Setlist (Avantasia)
Confira como foi o segundo dia (03/05) do Bangers Open Air 2025
Nossos agradecimentos a todos os responsáveis por tornarem o evento possível e, em especial, para a Agência Taga pela parceria, confiança e credibilidade dada mais uma vez à equipe do Universo do Rock. Nos vemos em 2026!
Seja o primeiro a comentar